segunda-feira, 10 de maio de 2010

O marido Perfeito mora ao lado


Por que estamos aqui?
Sei lá! Culpa dele, só dele.
Responde aí, Carlinho!
Ele não fala, ficou mudo.
Fala, Carlinho!
Conta a nossa história.
São dez anos.
Conta tudo, desde o começo.
O primeiro encontro, o vinho,
as flores, o beijo.
Não, o beijo não.
Disso ele não lembra mais.
Depois de um tempo
só ficam aqueles estalinhos de boa noite,
como dois compadres siberianos.
E as promessas, claro.
Conta pra ela, Carlinho!
Como não prometeu nada?
Cadê o cara que abria a porta do carro,
que elogiava o vestido,
que recitava poesia no ouvido,
que me olhava com fome
e enfiava a língua na minha garganta?
Você inteiro foi uma promessa.
Ninguém avisou que tinha prazo de validade.
É por isso que estamos aqui, doutora.
Eu te chamo de doutora ou pelo nome mesmo?
Então prefiro doutora.
A senhora pode me chamar de Olga.
Não gosto de formalidades.
Não é, Carlinho?
Fala, Carlinho!
Isso aqui é pra nós dois. Terapia de Casal.
Pra mim e pra você, entendeu?
Continua contando!
Pula pro apartamento.
Não é sexo, Carlinho!
Quer que eu fale de prazo de validade outra vez?
Fala do apartamento, quando fomos morar juntos.
Eu sei, você não me convidou.
Meus sapatos é que invadiram o teu closet,
os vestidos se apossaram dos cabides
e as blusas invadiram as gavetas.
Pra que você precisava de tantas camisas listradas?
E a coleção de calças de lã?
No Rio de Janeiro, Carlinho!?
Você não convidou, mas também não desconvidou.
Outra promessa.
Claro que era uma promessa.
Fiz comidinha, arrumei a cama, até lavei a louça.
Uma esposa vitoriana, que nem a tua mãe, a tua avó
e toda a italianada da tua família.
Como não era esposa?
Essa era a maior das promessas.
Você era perfeito, Carlinho.

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