Todas as manhãs, os reformados
Quintério Luca e Esmerado Fabião jogavam
damas no bar da vila.
Ocupavam sempre a mesma mesa,
junto à vitrina.
(...)Para haver desafinação são preciso 2 tocadores.
Quintério e Fabião preferiam essa fingida
desarmonia ao afinado silêncio de uma boca só.
Existiam juntos, como o pescoço
e a dobra do lençol.
Hora de fechar,Fabião e Quitério se retiravam
deitando uma derradeira olhada sobre o tabuleiro.
As peças ficavam em posição estudada e acertada.
Dia seguinte, regressavam e retomavam a partida.
Conversavam mais que jogavam.
Maldiziam o mundo(...)
Apenas o bar sobrevivia à deterioração geral.
O tempo é um fruto:
na medida,amadurece;
em demasia apodrece.
(...)Quanto mais envelheciam, mais os jogos
demoravam.
O último decorria desde há semanas.
Enquanto um jogava, o outro passava
pelo sono.
O aconchego do pequeno bar era o
melhor lugar para dormirem.
Ao menos ali estavam longe da
abandonada solidão de seus quartos.
O bar era o lar.
E cada um deles era, para o outro,
a humanidade inteira.(...)
Nenhum comentário:
Postar um comentário