sexta-feira, 30 de julho de 2010

Tratado sobre o namoro


¨Confio que há gente que não saiba namorar.
Não sabe namorar, e pronto.
Supõe que é instintivo, natural,
que é beijar, abraçar,
e os oceanos transportam a espuma.
Que basta amar e as relações funcionam.
Mas as relações queimam
pelo pouco uso.
A eletricidade enferruja.(...)
Namoro é ambição.
É um final de semana a cada dia.
É uma delicadeza insuportável,
antecipar os movimentos e agradar
quando não se espera.
Gentileza em cima de gentileza,
infindável.
Um cuidado para não magoar
com aviso e pergunta,
com aquela educação
concedida a gestantes e idosos.
Namorar requer uma atenção absoluta.
E não reclame:
amar pode ser para toda vida
quando oferecemos toda a nossa vida.
Tem que se preparar, ceder, abrir espaço,
oferecer,renunciar.
A inquietação nasce da paciência.
A criatividade nasce de uma porta fechada.
(...)No namoro, não existe
como ser egoísta.
Egoísmo se deixa na portaria.
É pensar pelo outro,
com o outro,
como o outro.
É ter uma lista de compras de mercado
na ponta da língua,
junto com o chiclete de melancia:
qual pasta de dente que ela usa,
o condicionador,
o azeite,
o leite que toma,
o suco...
Desconhecer a geladeira da namorada
é passagem direta para o congelador.
É entrar na livraria
e pensar no livro que ela vai gostar,
é entra numa loja e pensar
num vaso que combinaria
com sua sala(...)
É entrar em si mesmo
e lustrar as memórias
mais distantes para parecer órfão
antes de sua chegada.(...)¨
(Mulher Perdigueira -Não sabemos namorar-Carpinejar)

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