sexta-feira, 30 de julho de 2010

Bananas


"(...)Naquela manhã,
ela não comprou um cacho de bananas
como de costume.
Comprou 3 dúzias.
Encheu sua sacola de bananas.
Voluptosas, amarelas, listradas.
Exagerou,
mas pensou que as frutas
amadureceriam em semanas diferentes,
que faria uma torta, um doce.
Não previu que estava se matando.
Ao chegar em casa, suas meninas um tanto
mulheres se prontificaram a ajudá-la com a sacola.
Correram ao portão.
-Mãe, que pesado, o que trouxe?
-O que é isso,mãe?
-Mãe, para que 36 bananas?
-Isso não é normal,mãe.
-Mãe, vc caducou?Dá para montar uma banca.
Ela mexia os ombros,
envergonhada com o julgamento.
O inocente tem ares culpados.
O inocente não ensaia,
é pego desprevenido.
O inocente tem aparência muito mais criminosa
do que um culpado.
As filhas se reuniram na janta
e decidiram que a atitude de Manuela
extrapolara a normalidade,
um disparate,
infelizmente estava ficando gagá.
E duvidaram de cada evocação dali por diante,
de cada frase de Manuela,
da imaginação de Manuela.
Toda conversa isolada é a de um louco.
Questionaram seu domínio,
sua independência,
confirmaram fatos e datas para confundí-la.
Um velho não pode cometer exuberância,
saciar desejos,
vontades altissonantes e esquisitas.
Só o jovem.
Se o velho supera a medida,
já é visto como doente.
Esclerosado.
E não mais permitiram Manuela sair,
brincar com as amigas,
suspenderam suas atividades pela suspeita de doideira.
O tribunal familiar é o único
que ainda usa o confinamento.
Ao proteger, sufoca.
Ao cuidar, enfraquece.
Os prisioneiros do amor nunca serão soltos.
Ela não viu sentido em revidar,
entregou-se lentamente ao sofá.
Vidrada na televisão.
No aquário de seu vestido floreado.
Morreu em seguida de amargura.
Morreu pq comprou 3 dúzias de banana.
E tinha 82 anos."
(Mulher Perdigueira - Cachos Familiares - Carpinejar)

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