segunda-feira, 29 de outubro de 2007

Olhos de Vidro

Não se lembrava de ter se visto sem óculos.
Eram quase como uma extensão dele mesmo.
Sua parte mais delicada. De vidro.
Enxergava o mundo pela fragilidade de vidros embaçados pela chuva.
E, só agora percebia que estavam sujos.
Quem entrasse no banheiro momentos depois encontraria sobre a pia lentes quebradas e uma armação entortada por mãos sem olhos.
Estava decidido a enxergar a vida de outra forma.
Não sorriria mais cinza.
Era por isso aquela felicidade sem explicação.
O mundo havia estado muito tempo camuflado atrás de lentes que mostravam falsas verdades.
Enxergar não era apenas ver bem, era olhar com os outros sentidos.
E agora estava livre.
Amaria com as mãos, se deliciaria por cheiros, ouviria mais.
Tomou seu café já quase frio sobre a mesa, pagou e saiu.
Estava com pressa em chegar à rua.
Inebriado por tantos sons, tantos cheiros e pela chuva caindo livremente em seu rosto, não viu o sinal vermelho.
Morreu sem conseguir desfrutar completamente o dia que mais tinha visto o mundo.
Lidiane

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