quarta-feira, 19 de novembro de 2008

Encaixe perfeito

Eu realmente acreditava que o que me fazia amar
um homem era a inteligência.
Elucubrações e digressões me impressionavam.
Conhecimentos literários, artísticos, práticos
seduziam a eterna adolescente em mim.
Mas descobri que não era isso que me fazia amar:
de nada adianta um cérebro invejável,
citações brilhantes, se ele não rir das próprias besteiras,
se não souber aproveitar as delícias do ócio de um sábado quente.
Então percebi: bom humor era essencial.
É delicioso estar com alguém que vive sem arrastar correntes
e faz dos pequenos horrores cotidianos inevitáveis piadas.
Só que nem tudo é uma piada e, em certas horas,
quero alguém que me conforte a alma.
Nesses momentos, nada pior do que ser levada na brincadeira
- existe uma imensa diferença
entre a alegria de viver e a recusa a sair da infância.
Então fui invadida pela certeza
de que o que me fazia amar alguém era,
antes de tudo, a sensibilidade.
Telefonemas de bom-dia, olhares que vêem,
pequenos gestos incontidos - tudo o que eu podia querer.
Ou quase. Só sobrevive ao meu lado alguém que grite comigo
quando eu passar dos limites do bom senso,
demonstre desagrado quando eu exigir demais e oferecer de menos.
Preciso ser cuidada, mas preciso da certeza de estar com um homem de verdade
e não com um moleque preso no complexo de Peter Pan.
Quero ser domada, tomada.
Nem inteligência, bom humor ou sensibilidade me faziam amar alguém.
Talvez fosse virilidade.
Mal abrir a porta da sala e ser consumida por beijos.
Ter a roupa arrancada no caminho da cozinha.
Ser desejada com urgência é um dos maiores elogios
que uma mulher pode receber, mas só ser desejada de nada adianta:
quando acaba o suadouro, o que resta?
Se o que interessa é a movimentação, tudo bem.
Mas se existe a possibilidade de ser esmagada pelo vazio de sentido
após o orgasmo, de nada vale.
Pelo menos se não vier acompanhado de cuidado, carinho.
Pensei, então, que ele seria a pedra fundamental pra despertar meu amor.
Mas carinho é um sentimento abrangente demais:
nos invade desde a visão de um cachorro abandonado
até a palavra confortadora de um desconhecido.
Um dia, cansei de tentar adivinhar.
E, nesse dia, após tantas enumerações paralisantes e neuróticas, descobri.
Hoje sei exatamente o que me faz amar um homem: o amor existir.
Quando é necessário justificá-lo, procurá-lo, racionalizá-lo,
é sinal de que ele não está ali.
Simples assim.
Ailin Aleixo