quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

tempo,tempo,tempo,tempo...



...E quando eu tiver saído
Para fora do teu círculo
Tempo tempo tempo tempo
Não serei nem terás sido
Tempo tempo tempo tempo...
Ainda assim acredito
Ser possível reunirmo-nos
Tempo tempo tempo tempo
Num outro nível de vínculo
Tempo tempo tempo tempo...'

(Caetano-Oração ao Tempo)



'O bem mais valioso de nossa época não é o diamante

nem o petróleo, a fórmula da Coca-cola

ou o sorriso da Natalie Portman:

é o tempo.

Obedecendo à lei da oferta e da procura,

quanto mais escasso ele fica,

mais caro nos é.

A seca temporal é geral e irrestrita,

tão democrática quanto a calvície,

a saudade e a morte:

eu não tenho tempo,

você não tem tempo,

o Eike Batista não tem tempo,

o cara que está vendendo bala no farol,

em agônica marcha atlética para recolher

os saquinhos dos retrovisores,

antes que abra o sinal,

também não tem.
Como vocês devem saber,

o principal sintoma desta doença crônica

– sem trocadilho -

é a ansiedade.

Toda manhã, flagro-me aflito,

escovando os dentes, com pressa.

Vejo-me batendo os pés no hall,

enquanto o elevador não chega.

Até o segundo que o cursor do celular leva para piscar,

num SMS, permitindo-me digitar outra letra da mesma tecla,

deixa-me exasperado.(...)
(...)Há quem diga que a culpa

é da melhora das comunicações e, consequentemente,

do envio de dados.

Com a informação viajando tão rápido,

desaprendemos a arte da espera.

Antigamente, aguardar era normal.

Estávamos sempre esperando alguma coisa chegar.

Uma carta, pelo correio.

Um disco, do exterior.

Uma foto, um texto ou um documento, via portador.

Esses hiatos eram tidos como normais,

uma brecha saudável,

pausa para o cigarro ou o café,

a prosa, a leitura de uma revista,

o devaneio, a conversa na janela,

a morte de bezerra.

Hoje, não.

Tá tudo aqui, e, se não está, nos afligimos.

(...)
Enquanto não descobrimos a cura para este mal,

a única saída é aprender a lidar com ele.

Há que cercar com muros altos certas horas do relógio,

para que nada as possa roubar de nós.

Fazer diques de pedra em torno da hora de ficar com nosso amor,

da hora de trabalhar no projeto pessoal,

da hora do esporte,

de ler um livro,

encontrar um amigo.

Mesmo assim, vira e mexe, vêm as obrigações,

como um tsunami, ou os eventos sociais,

como meteoros, e derrubam as barragens.

Não há nada a fazer,

senão reconstruir os muros,

ainda mais fortes do que antes.
Você sente a mesma coisa, ou sou só eu?

Talvez seja só eu.

Quem sabe, numa manhã de terça-feira, lá por 1998,

eu tenha perdido a hora,

para nunca mais a encontrá-la?

Ficarei assim, trinta minutos atrás do resto do mundo,

tentando alcançá-lo, ininterruptamente,

como quem corre atrás de um trem, até o fim dos tempos.

Será que foi isso?'
(trecho do texto Tempo de Antonio Prata)

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