Educador popular, antropólogo e folclorista,
Tião Rocha fundou o Centro Popular
de Cultura e Desenvolvimento (CPCD)
por indignação e teimosia.
Essa ONG foi parida em 1984, em Belo Horizonte,
em meio à miséria, à dor, ao abandono e à esperança.
Na ocasião, Rocha começou se perguntando s
e era possível fazer educação embaixo de pé de manga.
Não só foi possível como ele e sua equipe
transformaram cafuné, abraço e sabão em pedagogia
e políticas públicas.
Os projetos do CPCD estão
em mais de 20 cidades brasileiras
e em três países
(Angola, Moçambique e Guiné-Bissau).
Como você diferencia educação de escolarização?
Escola é meio.
Educação é fim.
Há escolas muito bem equipadas
que têm uma educação medíocre
do ponto de vista
da formação dos seres humanos.
A gente observa, nos grandes centros,
escolas bem montadas,
mas que parecem uma cadeia,
cercadas de grades,
cheias de câmeras para policiar.
Comprovamos há 25 anos
que é possível fazer educação
de boa qualidade debaixo de pé de manga,
recuperando o sentido da educação
como prática humana.
Trabalho no interior de Minas Gerais,
onde as pessoas vivem em condições subumanas
e aonde a tecnologia ainda não chegou.
O fato de passar um canal lá de televisão
não significa que houve mudanças efetivas.
Houve informação, mas não transformação em conhecimento.
Vocês usam a pedagogia da roda. Como ela funciona?
A roda é um lugar da ação e da reflexão,
do ouvir e do aprender com o outro.
Todos são educadores,
porque estão preocupados
com a aprendizagem.
É uma construção coletiva.
Na roda você constrói consensos.
Porque todo processo eletivo
é um processo de exclusão,
e tudo que exclui não é educativo.
Uma escola que seleciona não educa,
porque excluiu alguns.
A melhor pedagogia é aquela
que leva todos os meninos a aprenderem.
E todos podem aprender,
só que cada um no seu ritmo,
não podemos uniformizar.
Nos seus projetos também foi adotada a pedagogia do brinquedo.
De que se trata?
A pedagogia do brinquedo veio responder
a uma pergunta:
será possível ter uma escola formal boa e prazerosa?
Será que os meninos podem aprender brincando,
ou a escola tem que ser um serviço militar aos 7 anos?
É a idéia de transformar o brinquedo
em instrumento de aprendizagem.
Percebemos que eles podem aprender tudo,
desde se alfabetizar até história, física, química,
matemática, e também cidadania,
ética, solidariedade, sexualidade.
Você fala em pedagogia do abraço.
Como funciona?
A pedagogia do abraço é uma forma de trabalhar
com grupos marginalizados,
não por carências nem pelo IDH,
mas pelas potencialidades.
Trabalhamos com o IPDH:
Índice de Potencial de Desenvolvimento Humano.
Começamos a falar em cafuné pedagógico.
Só sabe que é bom cafuné aquele
que já o recebeu uma vez na vida.
Então tivemos que fazer cafuné pedagógico,
que é possibilitar que o outro invista
no lado luminoso dele,
capaz de surpreender e de gerar.
Isso também começou em uma brincadeira
com meninos na periferia.
A minha brincadeira era dizer:
só vou dar um abraço apertado, daqueles
de quebrar costela, se você estiver com o cabelo penteado,
ou de batom, cheirosa.
Senão, comigo vai ser distância,
na ponta do dedinho.
Um jogo. Só que isso fez com que a meninada
levasse a sério. Nós percebemos
na comunidade e na escola a demanda dessas pessoas
que querem ser cuidadas,
que querem se gostar.
Percebemos que o afeto, o abraço,
o cafuné pedagógico favoreciam as pessoas
a sentir mais orgulho de si.
E as ajudavam a sair da linha de baixo,
do desprezo, para a de cima, da auto-estima.
É difícil convencer os governos a investir nesses projetos?
É difícil demais.
Imagine que a maioria dos órgãos públicos
trabalha com rubricas financeiras
e não em cima de plataformas, bandeiras e causas.
A educação é transformada em números.
A escola, que foi o aparelho ideológico
do estado na época da ditadura,
virou aparelho ideológico do mercado.
Você tem que formar gente para atender à demanda do mercado.
Há escolas em que o importante é formar,
empurrar para a frente,
não importa o tanto de alunos que deixou para trás.
Isso retira o poder de pessoas.
São jogos políticos, não de solidariedade.
O grande problema da escola atual
é que é cômodo ficar dentro de uma forma
que existe há 500 anos.
Ela ainda trabalha com conteúdos
absolutamente equivocados.
Os meninos têm que passar por sessões de tortura,
com informações sem a mínima importância.
Perde-se um tempo danado.
Conheça mais sobre o trabalho de Tião Rocha
no Centro Popular de Cultura e Desenvolvimento:
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