quarta-feira, 29 de outubro de 2008

Causos

Você já deve ter constatado que assunto puxa assunto,
o que Freud chamaria de 'livre associação'
os mineiros simplesmente
dizem que um causo puxa outro causo...
Ou uma crônica...
"Um órgão parecido com um coração foi encontrado,
no ínicio da tarde desta terça-feira,
dentro de um vidro na lixeira de um dos banheiros do terminal
de passageiros do Aeroporto de Confins.
De acordo com a assessoria de imprensa do aeroporto,
o órgão foi encontrado por um passageiro.
-Polícia!
Carregava um saco plástico transparente.
Dentro havia um vidro daqueles de boca larga,
de guardar biscoito de polvilho.
Aproximei-me e distingui o que me pareceu uma peça anatômica.
Identifiquei-me como psiquiatra
e pedi às pessoas se afastarem um pouco
para que pudesse socorrer o moço em crise de histeria.
Foi logo dizendo:
- Dr., toma isso aqui, não aguento nem ver sangue,
quanto mais um coração ainda fresco!
- Acalme-se, deve ser doação para transplante.
Sou médico e vou levá-lo para o Hospital das Clínicas.
Havia um envelope junto ao recipiente
e não hesitei em surrupiá-lo, despistadamente.
Pensei: "deve ser a explicação".
Aos seguranças apontei o moço:
- O pacote é dele.
Eu vi quando saiu do sanitário masculino.
Levaram-no para a Administração, acho.
Quanto a mim, saí de fininho. Longe de todos, li:
"Se você achou este vidro contendo um coração,
não o jogue fora.
É o meu.
Durante meses amei uma pessoa linda, maravilhosa,
alegre e radiante.
Ela não me conhecia,
mas eu descobri onde morava.
Toda manhã estava no mesmo ponto
em que ela tomava o ônibus para o centro.
Talvez nem me enxergasse,
nunca respondeu a um Bom dia! sequer.
Pensava nela durante o trabalho, o dia inteiro.
Ensaiei muitas vezes chegar perto,
identificar-me e declarar meu amor, mas não consegui.
Imaginava: Olha, moça, não te conheço,
mas quero te dizer que meu coração te pertence.
Eu te amo!De repente, ela sumiu.
Hoje cedo, vi a aliança em sua mão esquerda.
Concluí que se casara,
deve ter viajado para lua-de-mel e, agora, voltou.
Fui traído covardemente!
Resolvi desaparecer, viajar para longe, sem volta.
Antes de embarcar, arranquei do peito meu coração pulsante
e o deixei bem à vista.
Já vou embarcar. Adeus!
Peço a quem encontrar
que entregue o vidro e o bilhete
na Rua Eng° José Schultz Leonel, s/n. Bairro da Saudade."
Nas gravações das câmeras de segurança do aeroporto,
a polícia constatou a presença de um jovem
que claudicava em direção à fila para vôo 3341,
das 8,30h.
Semblante tranquilo, não chamava a atenção,
exceto por ter um imenso buraco no peito."