"O ato de ouvir exige humildade de quem ouve.
E a humildade está nisso:
saber, não com a cabeça
mas com o coração,
que é possível que o outro veja mundos
que nós não vemos.
Mas isso, admitir que o outro vê coisas
que nós não vemos,
implica em reconhecer
que nós somos meio cegos...
Vemos pouco, vemos torto, vemos errado.
Bernardo Soares diz que aquilo que vemos
é aquilo que somos.
Assim, para sair do círculo fechado
de nós mesmos,
em que só vemos nosso próprio rosto
refletido nas coisas,
é preciso que nos coloquemos fora de nós mesmos.
Não somos o umbigo do mundo.
Para se ouvir de verdade,
isso é, para nos colocarmos dentro do mundo do outro,
é preciso colocar entre parêntesis,
ainda que provisoriamente, as nossas opiniões.
(...)É norma de boa educação
ficar em silêncio enquanto o outro fala.
Mas esse silêncio não é verdadeiro.
É apenas um tempo de espera:
estou esperando que ele termine de falar
para que eu, então, diga a verdade.
A prova disto está no seguinte:
se levo a sério o que o outro está dizendo,
que é diferente do que penso,
depois de terminada a sua fala
eu ficaria em silêncio,
para ruminar aquilo que ele disse,
que me é estranho.
Mas isso dificilmente acontece.
A resposta vem sempre rápida e imediata.
A resposta rápida quer dizer:
“Não preciso ouvi-lo.
Basta que eu me ouça a mim mesmo.
Não vou perder tempo ruminando o que você disse.
Aquilo que você disse não é o que eu diria,
portanto está errado...”
(Ostra Feliz não faz Pérola-Rubem Alves-Pág 47)
Nenhum comentário:
Postar um comentário